Sob o Vulcão de Malcolm Lowry, 70 anos depois
Estamos debaixo do vulcão olhando por cima dele,
Vitor meu amigo do D. Cabral, BH, 1976
O livro Under The Volcano (Sob o Vulcão), escrito pelo inglês Malcolm Lowry (1909-1957) conheci e li em 1977 a edição publicada em 1975, pela editora Artenova com tradução de Maurício Gomes Leite e Angela Loureiro de Souza. Em 1992 o livro apareceria em outras traduções de Leonardo Fróes, uma pela Siciliano e outra pela L&PM Editores com o título, À sombra do vulcão. Eu morava em Belo Horizonte, tinha então 23 anos e estava mais perdido que o Cônsul em Cuernavaca (QUAUHNAHUAC) no México no dia dos mortos. Entretanto, antes de ler o livro eu já o conhecia através de um número especial do Suplemento Literário do Minas Gerais de 22 de setembro de 1973, organizado por Maurício Gomes Leite.
Em 1984 o romance virou filme no talento de John Huston como diretor e Albert Finney como cônsul “borracho” britânico Geoffrey Firmin. Não gostei muito do filme à época depois revi e dei os descontos devidos, afinal passar para a celulose uma obra-prima literária tão complexa, não é fácil mesmo! Tempos depois o assisti novamente bêbado e o efeito foi como rebater depois de uma bebedeira, indescritível e tão perturbador quanto o livro!
A Under The Volcano foi menosprezado pelo crítico Jacques Barzun, acusando-o de ser um plágio do livro Fiesta ou The Sun Also Rises (1926), traduzido aqui, ao sul do México, como “O sol também se levanta” de Ernest Hemingway e Ulysses (1922) de James Joyce. Bom isso eu não sei, li Hemingway, mas não consegui ler Joyce, mas se a comparação for etílica isso pode proceder. Maurício Gomes Leite menciona que mais de trinta tipos de bebidas alcoólicas são citadas e consumidas no livro de Lowry. No de Hemingway o liquido bem e maldito também corre em riachos. Na época eu também era um consumidor dessa mercadoria molhada e infernal. O mesmo se o foco for os cornos reais e imaginários dos protagonistas, sem contar a solidão infernal deles e os meus e a minha em 1977. É melhor deixar pra lá!
Por que só agora, julho de 2017, 40 anos depois de ler aquela obra-prima recordei-me do “Vulcão”? E que por pura coincidência este ano o livro está completando 70 anos de sua publicação...
É que o meu amigo Altamir F. Sousa recomendou-me o livro publicado em 2014, “Viva” de Patrick Deville, francês, nascido em 1957, publicado pela Editora 34, traduzido por Marília Scalzo e publicado no Brasil em 2016, onde o Consul bebum ressuscita ali das cinzas do vulcão do passado, ao lado de centenas “walking deads” que viveram no México e morreram, mas que ninguém contou para eles e alguns ainda hoje teimam em ressuscitar: Trotsky, Kahlo, Greene, Rivera, B. Traven, Siqueiros, Artaud, Breton, Tina Modotti, Mercader e outros intelectuais (machos e fêmeas), ditadores, assassinos, revolucionários, mártires e loucos de todas as espécies, ainda que alguns fossem normais e muitos mortos e muitos riscados cruelmente da História pelas mãos sujas dos tiranos que estavam supostamente tentando redimir a história de suas vítimas. Ali como abutres, marxistas, sinarquistas, comunistas, trotskista, estalinistas e anarquistas disputavam a carniça humana, que se refugiou naquele umbigo do mundo. Além de alguns outros heróis e traidores de alguém ou de uma causa...mesmo que fossem de suas e seus próprios amantes. Afinal não é mesmo no México que os mortos não morrem mesmo?
Este opúsculo denso, "Viva!", constrangedor e apaixonante, poderia ser considerado à revelia como uma continuação mais instigante e visceral de “Rumo à estação Finlândia” de Edmund Wilson, publicado em 1940 e traduzido no Brasil em 1986.
Mas voltando ao livro de Lowry, que me deu uma vontade idiota de reler, possuo cerca de uma dezena de artigos de revistas jornais sobre ele. E sempre as imagens e recordações sublimes e/ou cruéis das cidades onde as coisas acontecem: Cuernavava (Ouro Preto), Oaxaca (Mariana); Cuernavava (Patos de Minas), Oaxaca...
Em determinada parte do romance, o Consul, num de seus momentos de embriaguez e solidão supremas, suplica para Yvone sua amada perdida, achada, perdida: “Eu suplico, deixe-me fazê-la feliz, liberte-me desta terrível tirania do eu. Caí muito baixo. Deixe-me cair ainda mais, para que eu possa conhecer a verdade. Ensine-me a amar novamente, a amar a vida.”
Aliás, no livro todo, como em nossa vida real, em outras obras literárias estamos todos lamentando o que não existe mais: o tempo perdido, a saúde, o passado, um amor...
Todos nós possuímos um pouco de Consul e um tanto de nós mesmos...só não sabemos a proporção de um e de outro. Ainda bem! Hoje bem que poderia ser sexta-feira...
José Eduardo de Oliveira – Patos de Minas - 13.07.2017, dia do Rock, mas o livro pode também ser considerado uma ópera-rock!
Publicado na FOLHA PATENSE, 29.07.2017, N. 1266, ANO XXV, P. 15
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