HOSPITAL
REGIONAL 90 ANOS
QUASE
UMA SANTA CASA DA MISERICÓRDIA...
“ANTÍGONA:
Ninguém poderá me acusar de não cumprir um piedoso dever.” Sófocles
Neste dia 18 comemoram-se 90 anos da
inauguração do Hospital Regional “Antonio Dias”, inaugurado no dia 18 de julho
de 1930.
Recentemente a imprensa patense noticiou
a fundação de uma Santa Casa da Misericórdia em Patos de Minas. Notícias de
construção de hospitais são sempre alvissareiras, sobretudo em tempos de
pandemias.
Desta feita, recordei-me que Patos de Minas
no inicio do século XX quase já teve a sua Santa Casa da Misericórdia, que
acabou se transformando no Hospital Regional “Antônio Dias” de Patos de Minas.
Nada a lamentar.
Pois, neste brevíssimo proêmio desejo
apenas ressaltar, que no presente o atual Hospital Regional a despeito de suas
dificuldades de toda a ordem, seus problemas, suas mazelas e seus dilemas e
inúmeros detratores – inclusive neste período de pandemia, onde nem ele e
nenhuma instituição de saúde pública estava preparado para essa tragédia-, durante
estes últimos 90 anos, no meu ponto de vista, superou em muito o que seria uma
Santa Casa de Misericórdia de gênese portuguesa, em todos seus os aspectos. A
História destes noventa anos de atendimento hospitalar à comunidade Patense e
toda a região ainda está para ser contada, uma história, não só das vidas que
foram salvas e dos doentes que foram curados, mas de médicos, enfermeiros e
funcionários dedicados e que alguns, pelo seu denodo e amor à profissão,
possuem histórias que beiram à santidade
por suas obras e suas nobres ocupações de salvar vidas e curar pessoas de todas
as classes sociais. Eu mesmo sou testemunha, eu e toda minha família recebemos
atendimento médico-hospitalar neste histórico e glorioso Hospital, e para
encerrar esse exórdio, minha neta nasceu ali.
A
ORIGEM DAS SANTAS CASAS DA MISERICÓRDIA
No contexto histórico europeu, do fim da
Idade Média e o fortalecimento das cidades e paradoxalmente o aumento da
miséria, pobreza urbana e surtos constantes de pestes, sob a invocação de Nossa
Senhora, Mãe de Deus, Virgem Maria Mãe da Misericórdia, um grupo de leigos e um
frade trinitário, sob a chancela imprescindível da Regente de Portugal, D.
Leonor (1458-1525), foi fundada no dia 15 de agosto de 1498, a Santa Casa da
Misericórdia em Lisboa. Já existiam em toda a Europa irmandades muito
parecidas, inclusive em Portugal, e que talvez por sua vez, tenha se inspirado
em alguma instituição, sobretudo de Florença, mas doravante, criou-se um modelo
caritativo novo e mais abrangente.
Diferentemente de outras ordens
terceiras, irmandades e confrarias religiosas do Império Português inclusive do
Brasil, que prestavam assistência principalmente aos seus associados, a Santa
Casa ou Casa de Caridade, de um profundo espírito religioso e caritativo, em
suas obras tinha como finalidade atender aos pobres e desvalidos, católicos, independente
de sua etnia, gênero ou nacionalidade.
Em seus estatutos iniciais, que variavam
os números de irmãos da mesa diretora, de região para região, constavam de sete
obras espirituais: ensinar os ignorantes, dar bom conselho, castigar com
caridade a quem erra, consolar os infelizes, perdoar a quem nos ofendem, sofrer
as injúrias com paciência e orar a Deus pelos vivos e pelos mortos; e as sete
obras corporais: resgatar cativos e
visitar os presos, curar os enfermos, vestir os nus, dar de comer aos famintos,
dar de beber ao que têm sede, dar
pousadas aos peregrinos e pobres, enterrar os mortos. Outras obras que também
executaram foram: cuidar das crianças expostas, garantir dotes para moças sem
recursos e sem máculas, além de recolhimentos femininos, colégios para órfãos
além de hospícios para alienados e
gafarias. Nem todas as Casas de Caridades conseguiram executar todas essas
obras, algumas, sobretudo no Brasil, apenas “curaram os enfermos”, em seus
“Hospitais da Caridade”, o que foi uma das obras, talvez a maior e a mais
premente, sobretudo no passado e até aos dias de hoje.
As Casas da Misericórdia, não surgiam do
nada, ou como no caso português, mas sua criações foram impulsionadas pelas
casas reais, ou Casas de Câmaras e elites e/ou potentados de vilas e cidades do
Império Português e as receitas para suas fundações eram inúmeras inclusive,
concedidas de rendas que eram para o Governo. Muitas se iniciaram através de
rendas e benefícios e imóveis de testamentos, aliás, os legados foram uma
constante fonte de recursos, sem contar as esmolas e doações de seus próprios
membros. Mais tarde criaram-se loterias.
Com a expansão comercial e marítima, os
portugueses levaram com eles a criação das Santas Casas da Misericórdia para
todo seu império, além do Brasil, foram criadas na África, Índia, China,
Ceilão, Malaca e outros lugares, muitas de duração efêmera.
No Brasil, apenas para se ter uma ideia,
a primazia de fundação tem sido dada à que foi criada em Santos, em 1543 ou a
de Olinda que disputa por ter sido criada entre 1539 e 1540, a de Salvador,
1549, a de Vitória, em 1551, Olinda de Ilhéus, década de 1560, Rio de Janeiro,
1582. No século XVII, elas continuaram sendo criadas, como a de São Paulo, c. 1605, mas no século XVIII, com
exceção da de Ouro Preto, criada em 1735-1738, poucas outras surgiram como
misericórdias de fato. Entretanto, nos séculos seguintes, se espalharam por Minas
e por todo o Brasil.
A
MEDICINA EM PATOS ANTES DO HOSPITAL REGIONAL,
EX-
SANTA CASA DA MISERICÓRDIA
Pensei inúmeras vezes em não escrever
sobre este assunto, não que ele deixasse de ser relevante, mas porque depois de
pesquisar alguns autores e autoras que
escreveram sobre esse assunto e outras fontes, quase conclui que provavelmente
não acrescentaria nada de novo sobre os projetos de uma Casa de Caridade em
Patos de Minas que acabaram se transformando no atual Hospital Regional. E que
o que seria mais interessante deveria ser a História do Hospital Regional de
1930 aos dias atuais. Depois, com
otimismo, pensei que o que eu acrescentasse sobre o que já escreveram, talvez fosse
importante, para alguém ficar inspirado e escrever alguma coisa mais
consistente.
A verdade é que até 1930, Patos de
Minas, ainda não tinha um Hospital, e infelizmente, outras partes do Brasil, a
despeito das inúmeras Santas Casas, espalhadas por seu imenso território, ainda
careciam dessa importante instituição. E não foi por falta de incentivo dos
governos e nem das comunidades.
A questão da saúde pública
continuava praticamente a mesma, onde
não tinha Santa Casa, os pobres e viajantes, às vezes contavam com a caridade
de algumas irmandades, que apesar de não tratar deles, às vezes por misericórdia e por ato caritativo
lhes davam um enterro cristão. Os mais favorecidos tinham tratamento em casa
por médicos e cirurgiões particulares, situação que chegou até ao século XX. E
acontecia de um ou outro médico prestar algum atendimento a quem não podia
pagar, mas o resto se valia de boticários, curandeiros, raizeiros e charlatães.
Ficando apenas em Minas Gerais, que em
outros estados não foi diferente, e pesquisando sobre a história da saúde, a
situação sempre foi precária desde o século XVIII. Falta de médicos, remédios e
hospitais foram a regra e não a exceção. Como já citei, pode-se dizer, que em
Minas no setecentos, tivemos de fato, apenas a fundação de uma Santa Casa em
Ouro Preto, fundada oficialmente em 1738, e que mudou várias vezes de lugar e
que aos trancos e barrancos existe até hoje. No século XIX, outras surgiram, a
de Belo Horizonte, capital desde 1897, seria fundada em 1899.
E um fato curioso, segundo o Jornal, A
Ordem (Ouro Preto, 25.01.1890), no ano anterior, no dia 18 de junho de 1889, “foi inaugurada na cidade do Carmo do
Paranaíba uma Santa Casa de Misericórdia, ali fundada a esforços de generosos e
distintos cidadãos, à frente dos quais se colocaram os Srs. Dr. Antônio
Zacharias Álvares da Silva...”.. E que “...no
respectivo hospital está prestando desinteressadamente seus serviços médicos, e
ainda, com caridade exemplar, fornece grátis remédios e dietas a enfermos.”
E que funciona lá até hoje. Um detalhe, Dr. Antônio Zacharias (1847-1905), foi
o primeiro médico a residir em Patos e havia
sido nos dois anos anteriores, Presidente da Câmara Municipal de Patos, até que
mudou-se para o Carmo.
Assim, com a saída do Dr. Antonio
Zacharias, a situação aqui se agravou,
inclusive, parece que a nossa cidade
ficou sem médico nenhum, o Jornal, “O PHAROL”, de Juiz de Fora, nº 249, de
24/04/1902, publicou o seguinte, “AOS
MÉDICOS – A cidade de Patos não tem médico e o povo reclama a presença de um. O
que para lá for ganha dinheiro, na certa.”
E também, segundo o site da Santa Casa
de Misericórdia de Patrocínio, foi inaugurada em 7 de setembro de 1938. E no
convite para a inauguração consta: “...a
Santa Casa é o fruto laborioso de sua gente trabalhadora e empreendedora, que
tudo faz para ver a sua terra grande, próspera, feliz, cheia de conforto para o
bem comum da humanidade.” Também está em exercício até hoje.
Entretanto, parafraseando, o
ex-presidente da República Washington Luiz, que governou de 1926 a 1930, “A saúde pública era um caso de política”,
mas as leis eram feitas, mas nunca eram cumpridas.
Com no início do século XIX, era público
e notório a precária situação de
atendimento hospitalar no Brasil, o imperador D. Pedro I (1798-1834), acabou
por decretar a Lei de 1º de Outubro de 1828, que dava mais autonomia para as Câmaras
Municipais de todo o Império, e em seu artigo 69, estipulava que elas, “Cuidarão
no estabelecimento, e conservação das Casas de Caridade, para que se criem
expostos, se curem os doentes necessitados, e se vacinem todos os meninos do
distrito, e adultos que o não tiverem sido, tendo Medico, ou Cirurgião de
partido.” Letra-morta!
Dez anos depois, no dia 2 de Maio de
1839, Bernardo Jacintho da Veiga (1802-1845), governador da Província de Minas
Gerais (1838-1840 e de 1842-1843), sancionou uma lei que em síntese
preconizava: “É permitida a ereção de um
Hospital de Caridade em todas as Cidades e Vilas, que ainda estiveram privadas
deste benefício. (...) As Câmaras
promoverão subscrições pelos habitantes dos seus Municípios para a construção
ou compra dos edifícios indispensáveis, e para o fundos das despesas dos ditos
Hospitais...”. Letra-morta!
Depois de uma lei imperial e outra
provincial, passemos a uma lei de âmbito municipal, e como Patos ainda era uma
vila desde 1866, mas de fato, desde 1868, a Resolução, entretanto, veio de
cima, assinada pelo então presidente da Província
de Minas (1876), Francisco Bonifácio de Abreu, o Barão da Vila da Barra
(1819-1887). De acordo com a Resolução Nº 2367, de 12 de Julho de
1876, que são as Posturas da Câmara da Vila de Patos: “Sobre a Educação e Casa de Caridade. Art. 157. A Câmara, logo que
puder, estabelecerá uma casa destinada a recepção de expostos para depois serem
distribuídos por amas. Haverá na casa uma roda de expostos, uma ama de leite
para amamentar os meninos, enquanto não forem dados a quem os crie...”. Na verdade, a obrigação de cuidar de expostos,
ou crianças enjeitadas pelos pais e abandonadas nas rodas dos expostos, até o
século XVIII, eram obrigações devidas às Câmaras Municipais, posteriormente
além delas, algumas Casas da Misericórdia ficaram com essa incumbência. Aqui, também
letra-morta!
Dezenove anos depois,
quando o Brasil já era uma República, desde 1889, no dia 14 de maio de 1895, e três anos depois
da Vila de Patos ter se transformado na cidade de Santo Antonio dos Patos, o Agente
Executivo, Major Jerônimo Dias Maciel (1831-1906), que além de ter sido boticário
ou farmacêutico, foi o primeiro presidente da Câmara Municipal da Vila de Patos
de 1868 a 1873 e depois de 1895 a 1906, quando foi
o signatário da Lei Nº 17 de 14 de maio de 1895, o Estatuto Municipal do
Município de Santo Antônio de Patos, que trás como sendo atribuições da Câmara,
“Capítulo VI, Dos serviços municipais”,
em seu “Art.14. A inspeção dos cemitérios, hospitais, ...” e em seu “Art.29.
São serviços municipais:”, inciso,
“27. A fundação de hospitais para doentes pobres, asilos para mendigos, casas
de maternidade para parturientes pobres e outros estabelecimentos de
beneficências...”. Letra-morta!
O hospital só seria fundado
35 anos depois. E por uma ironia do destino, teria o nome de seu irmão, Antônio
Dias Maciel (1826-1910) e quem foi por assim dizer, o benemérito e que se
destacou dentre tantos, e quem possibilitou a concretização da ideia e a sua inauguração
foi o seu sobrinho, Olegário Dias Maciel (1855-1933), que inclusive o inaugurou,
no dia 18 de julho de 1930, como
presidente do Estado de Minas Gerais (1930-1933).
E neste ínterim, vem a luz,
vem a água encanada, a educação, a urbanização, o comércio, menos o
hospital. Mas este florescente burgo nunca
ficou totalmente desassistido. E de acordo com Oliveira Mello, Geraldo Fonseca
e Giovanni Roncalli Ribeiro, além de vários farmacêuticos, e desde 1886 com a
vinda do Dr.
Antônio Zacharias Álvares da Silva, o primeiro médico da Vila, vários outros
médicos aqui trabalharam. Com destaque para o baiano Dr. Eufrásio José
Rodrigues (1873-1957). E depois, os primeiros médicos naturais daqui, primeiro
em 1913, Dr. Adélio Dias Maciel (1889-1953) e depois em 1914, Dr. João Borges
Júnior (1886-1980).
Roberto Capri, em sua
publicação, “O Município de Patos de Minas”, de 1916, registrou que aqui
atuavam os seguintes médicos: Dr. Eufrásio
José Rodrigues, Dr. Adélio Dias Maciel e João Borges Júnior; os farmacêuticos:
Agenor Dias Maciel, João Gualberto Amorim Júnior, Wagner Correa, Aurélio Theodoro de Mendonça e
os dentistas: Afonso Borges, Lindolfo Nogueira, Osório Correa da Costa,
Bernardino Correia da Costa e José de Ulhôa Mello.
Dr. Eufrásio Dr. Adélio Dr. João Borges
Fotos Roberto Capri, 1916
Dr. Eufrásio Dr. Adélio Dr. João Borges
Fotos Roberto Capri, 1916
O SONHO DA SANTA CASA DA MISERICÓRDIA E A REALIDADE DO HOSPITAL REGIONAL
Se em 1916 ainda não tinha
um hospital em Patos, entretanto os sonhos e os projetos para que isso se
concretizasse estavam em andamento e como veremos, brotaram no ano de 1906.
E pelas fontes que possuo,
a primeira menção ou pelo menos o primeiro apelo que não partiu dos
legisladores, para que isso acontecesse veio através do médico baiano, Dr. Eufrásio José Rodrigues que para
aqui se mudou no início do século XX. Natural de Salvador, onde em 1549, foi
fundada talvez a mais sólida, organizada e importante Santa Casa da
Misericórdia do Brasil desde os tempos coloniais e ainda hoje em funcionamento:
a Santa Casa da Misericórdia da Bahia. Então ele tinha uma boa referência.
Dr. Eufrásio desde 1905 já colaborava
com alguns artigos no primeiro Jornal de Patos, “O Trabalho”, onde assina como
“Dr. E. Rodrigues”, e foi aí, no dia 9 de Dezembro de 1906, em seu número 4, do
ano 2, página 1, na matéria, “Rabiscos e Sinecuras”, depois de fazer diversas
observações sobre os diversos problemas
da cidade, exorta: “Agora dizemos nós,
para aqueles que querem iluminações, automóveis, carros de praça etc.,
preferimos um serviço de desinfecção, um pequenino hospital, ...”.
Quase dois anos depois, no mesmo jornal,
“O Trabalho”, de 29 de Março de 1908, em seu número 55, do ano III, página 1,
no artigo, “A Casa de Caridade”, ele faz nova e mais séria admoestação: “Em nosso País mesmo, a História das epidemias nos traz
páginas desastrosas. Que será de uma população como a de Patos se não tiver um
hospital, quando a varíola, o cólera ou a febre amarela vier visita-la?-
Morrerão todos porque foram imprevidentes, ou porque tiveram dó de gastar um
pouquinho de dinheiro em favor daqueles a quem a mesquinha fortuna vai retendo
escassamente no centro da penúria. É preciso que nos unamos todos em uma
cristalização de ideias, e fundemos uma
Confraria de Misericórdia, para a aquisição de uma Santa Casa; se esta [não]
nos servir de utilidade, servirá para
algum de nossos filhos, cuja sorte não
podemos prever.” Este mesmo texto
seria publicado novamente no Jornal “Cidade de Patos” do dia 18 de Abril de
1915, sabe-se lá para quê!
Mesmo Patos não sendo um deserto seu
clamor foi ouvido. E segundo depoimentos escritos dos mesmos autores que citei
acima, Oliveira Mello, Geraldo Fonseca e Giovanni Roncalli Ribeiro Caixeta, incluindo
os de Dilson
Abel Pacheco e Risoleta Maciel Brandão, estes dois últimos de 1980, quando do
quinquagésimo aniversário do Hospital Regional, o jornal “Cidade
de Patos” – que infelizmente não tive acesso -, noticiou o início para a
realização do sonho do Hospital de Caridade.
Nas palavras de Giovanni Roncalli Ribeiro na
Revista ALPHA, nº. 9, 2008, p. 74, que tomei a liberdade de transcrever por ser
a síntese mais completa destes acontecimentos, relatou que: “Em
fevereiro de 1915, o semanário ´Cidade de Patos´ anunciava a ideia da
construção de uma Santa Casa de Misericórdia. Foram os líderes desse movimento
os médicos Dr. Adélio Dias Maciel e Dr. João Borges, os farmacêuticos Agenor
Dias Maciel e João Gualberto de Amorim Júnior e o cônego Getúlio Alves de Meio.
Por sugestão do Dr. Adélio, comitês foram formados na cidade e nos distritos,
chegando a ser fundado, no papel, o Hospital Santo Antônio. O capitão José de
Santana, o major Gote (Sesóstris Dias Maciel) e o senhor Zacarias Albino
fizeram a doação de um terreno, sendo iniciadas as obras em 1920. Foram
utilizados todos os recursos do caixa conseguidos até então, contribuições da
Câmara Municipal, de dona Etelvina Maciel e outras senhoras, além de materiais
da antiga Igrejinha do Rosário, demolida no ano anterior. - Por falta de
financiamento, as obras foram paralisadas até que Olegário Maciel,
vice-presidente do Estado, ocupando a presidência devido à ausência de Raul
Soares, retomasse a sua construção, em 1924. Três anos depois, diversos
materiais que já estavam armazenados em Patos foram levados para o hospital de
Barbacena, pela força política dos Andradas. Em 1929, por intermédio de
Olegário Maciel, então no Senado Mineiro e Dr. Adélio Maciel, na Assembleia
Legislativa, o presidente Antônio Carlos destinou, com diplomacia, novas verbas
para o término do hospital.”
E sobre estes mesmos acontecimentos, o
interessante é que o Hospital ora aparece como Santo Antônio, o Padroeiro da
cidade, ora aparece como Casa de Caridade ou mesmo Casa de Misericórdia. Abaixo
transcrevo parte de uma série incompleta de jornais e outros documentos que
tratam da construção do Hospital até cerca de 1930. Desde já, agradeço ao Prof.
Altamir Fernandes de Sousa que me forneceu grande parte destes documentos e que
contribuíram para que eu cometesse essa transgressão escrita.
Uma das primeiras manifestações
impressas, que possuímos aqui, sobre a concorrida e importante reunião do dia
21 de Fevereiro de 1915, para a Fundação da Casa de Misericórdia foi através do
Jornal, “O Grito”, do dia 22 de Março de
1915, foi uma matéria assinada e cheia
de otimismo e o espírito das velhas Casas da Misericórdia e que dizia o
seguinte: “HOSPITAL S. ANTONIO – Como se
sabe trata-se nesta cidade da fundação de uma Casa de Misericórdia. – Foi esta
alevantada ideia movida por sentimentos de caridade e de amor aos desprotegidos
da sorte, sentimentos estes que exornam sobremaneira as qualidades morais dos
promotores de tão edificante empreendimento. – Ninguém negará aplausos francos
a esta grande obra humanitária, a maior que esta cidade poderá se ufanar de
possuir. – Ali encontrará o nosso irmão pobre, o pão quotidiano para satisfazer-lhe
as exigências do organismo debilitado pela miséria, os medicamentos para lhe
minorar as dores até então sofridas com resignação: os sacramentos para
tranquilizar-lhe a consciência deturpada pela falta de assistência espiritual.
– Não basta porém que de braços cruzados aplaudamos a ideia, aguardando a
realização da mesma; preciso é que cada um de nós se compenetre do grande e
impreterível dever do amor ao próximo e trabalhe esforçadamente, seja
angariando esmolar, seja promovendo festas em benefício do hospital, como
representações teatrais; quermesses etc. – Para tanto contamos em nosso meio,
moços inteligentes, capazes de desempenhar papeis que no drama, quer na
comédia. – Proporcionaremos deste modo ao público, algumas horas de gozo, contribuindo
ao mesmo tempo para a construção rápida do prédio destinado aos nossos irmãos
pobres. – Quanto às quermesses, ficarão a cargo das nossas caridosas
senhoritas, que temos hábeis costureiras, exímias bordadeiras, consumadas
desenhistas, que não se negarão, para fim tão louvável, a oferecer uma prenda
ou melhor, vende-la pessoalmente. Assim, serão em breve satisfeitas, as
ardentes aspirações do povo essencialmente altruísta desta cidade, - Se terá ou
não bom acolhimento?...é ideia do
Jademiro Gomes.”
Outra avaliação do que foi a reunião do
dia 21 de fevereiro e os seus resultados, foi a que apareceu no Jornal, “O Riso”, do dia 10 de abril de
1915, p. 1, que apesar de não ser
assinada, era público e notório que o responsável foi o jornalista Alfredo
Borges (1878-1940), que comenta de forma
crítica e exacerbada, em uma longa
matéria os eventos iniciais sobre a fundação do Hospital ou Casa de
Caridade, : “CASA DE CARIDADE – Irá avante
este louvável empreendimento? - Em vista dos diligentes cidadãos que se acham à
sua frente, da enorme concorrência que houve à reunião que aqui se realizou aos
21 de Fevereiro no Cinema Magalhães, onde se deram os primeiros passos a
respeito, era de se crer que assim em breve acontecesse. – No entanto, nós
apesar de nos acharmos ao lado daqueles que vêm pugnando para levar à realidade
a fundação do Hospital de Santo Antônio, já nos sentimos, não desanimados,
visto como em prol da grandiosa ideia havemos de trabalhar animados até [ao]
final, mas um tanto duvidosos, um tanto descrentes... – De fato, em
consideração às diminutas quantias com as quais os nossos capitalistas,
comerciantes e boiadeiros, etc., abriram as subscrições, que, pelo Comitê
Central, lhes foram apresentadas, podemos afirmar, ainda que sentidos, tão cedo
não teremos Casa de Caridade, tão cedo essa nossa justa aspiração não será
satisfeita. – Sim, porquanto angariar donativo, tirar esmolas para a edificação
dum prédio, por singelo que seja, não é o mesmo que pedir auxílios para a
construção dum pequeno jardim, para a construção duma pequena linha telefônica,
porque com estes se gastam 2 a 3 contos e com aquele 30, 40 e mais. E no
entanto, o povo desta terra, assim não compreendeu.- Tanto é assim que os
nossos mais fortes capitalistas, causa-nos admiração, subscreveram-se apenas,
com 100$000 [cem mil réis] , o que ora nos faz perguntar-lhes – Essa quantia é
a primeira prestação? Sendo as demais feitas mensalmente, durante um ou dois anos consecutivos e de
conformidade com as condições de casa um?- Desse modo é que devíamos proceder.
Pois, se somos deveras caridosos, se alimentamos com sinceridade em nossos
corações esta sublime virtude cristã, e não ignoramos o quanto é mister em toda
a cidade uma Santa Casa, onde os desvalidos, os desprotegidos da sorte se abrigam,
porque não distribuímos com eles, o que para nós as mais das vezes é
supérfluo?!...- Porventura ignoramos que, quem dá de coração ao pobre empresta a Deus, a juros de cento por cento?
– Ou somos um povo indiferente? – Não! Estamos
certos que não! – Houve, apenas, má compreensão do que se tratava. –
Façamos, então, como em Dores, onde o Rvmo. Vigário, abriu a primeira
subscrição com a quantia de 5:000$, seguindo diversos outros cavalheiros com
2:000$ [dois contos de réis], e 1:000$, quando iniciaram a construção da nova
Matriz. – Procedamos de igual modo e havemos de ver, com satisfação, em um
curto espação de tempo, o nosso louvável empreendimento coroado de êxito. – Há
no município capitães, donde se podem tirar, um, dois até cinco contos sem o todo
sofrer o menor abalo. Avante, pois, senhores capitalistas, comerciantes,
boiadeiros e ricos fazendeiros, reformemos as quantias subscritas, tenhamos
mais caridade para com os pobres e menos amor ao nosso dinheiro. – Que as
nossas palavras não sejam ditas no deserto e que os 50$ e 100$ sejam logo
transformados em 1:000$ e 2:000$, são os votos sinceros do O RISO.”
A descrença, a falta de perspectivas com
a saúde no Brasil e em Minas particularmente, era geral na Primeira República
(1889-1930), o fim da Primeira Guerra (1914-1918) e depois com a Gripe
espanhola (1918), alguma coisa tinha de ser feita, infelizmente aqui, não é
possível discorremos sobre todos os eventos destes anos, mas direi mais uma ou
duas palavras. Neste mesmo e conturbado período, sobretudo com a mudança da
Capital de Ouro Preto para Belo Horizonte em 1897, e a construção de sua Santa Casa de
Misericórdia e todas as outras
dependências de especialidades ligadas à saúde e os seus desdobramentos,
inclusive a Faculdade de Medicina (1911), além das mudanças não só dos
paradigmas em tratamentos e pesquisas, mas de profundas mudanças na forma de
tratar e pensar a Saúde Publica, principalmente a partir de 1918. E é nesse momento, por exemplo, que os
governos federal e estadual começam a
construir e regionalizar os hospitais, além de olharem com mais atenção para o
interior do País, sobretudo com a criação dos serviços de profilaxia rural. (CHAVES,
2011, P. 50) Aliás, beneficiando, Patos,
e que, “Graças à interferência do eminente personagem [Carlos Chagas], a 19 de
março de 1924, instalava-se o ´Posto de Profilaxia Rural’ em Patos.” (BRANDÃO,
1981, P. 127)
Mas a insatisfação era reinante não só
nos pacientes, claro, mas também das autoridade ligadas à medicina. Relatarei
somente um desses casos, e que não deixa de estar relacionado com o brado do
jornalista d´O Riso, Alfredo Borges. Quando o médico sanitarista Belisário Penna
(1868-1939), que sempre discursava de
forma acirrada, como por exemplo: “´Minas
é, sob o ponto de vista da precariedade de saúde, do definhamento da raça e da
pobreza dos seus habitantes, o mais infeliz dos estados da federação (...)
incrível o descaso ou a indiferença dos governos estadual e municipal de Minas
pela sorte de seus filhos, e mais inacreditável ainda é esse abandono criminoso
(1918)´. Penna salientava ainda que
Minas Gerais é um lugar onde se deu mais importância ao boi e ao porco que à
saúde de sua população.”( CHAVES, 2011, P. 49)
Entretanto, a campanha de arrecadação,
para a Santa Casa de Caridade, estava em
andamento, como nos mostra o Jornal “Cidade de Patos” de 11 de Abril de 1915,
na página 1, “SANTA CASA – Consta que o
Prof. Oscar Rodarte, está promovendo para o dia 21 deste, uma bela festa
infantil que se realizará no Cinema Magalhães em benefício da Casa de Caridade.
– Nesta cidade, segundo estamos informados, já montam a perto de 6 contos de
reis os donativos angariados para a fundação da Santa Casa. - O Comitê Central,
avisa, por nosso intermédio, às Exmas. Senhoras que fazem parte dos Comitês dos
distritos que devem promover o mais rápido possível subscrições populares cujo
produto deverá ser recolhido mensalmente à Tesouraria do mesmo Comitê.”
De qualquer forma, alguns patenses
contribuíam de uma forma ou de outra, como nos mostra o Jornal “Cidade de
Patos” de 2 de maio de 1915, na página 2, é publicada uma carta do Prof. Oscar Rodarte, onde ele “...agradece desvanecido as palavras que a
´Cidade´ se referia às festas que se fizeram, em 21 e 22 do corrente, em
auxílio ao hospital de ´S. Antonio´.”
E no mesmo Jornal e na mesma página,
aparece: “SANTA CASA – Comunica-nos o Sr.
Cap. João Gualberto de Amorim, tesoureiro do Comité encarregado de angariar
donativos para a fundação da casa de misericórdia nesta cidade já se acharem
[em] seu poder as seguintes importâncias:- Importância entregue pela Exma. Sra.
Georguetta Maciel, e recebida na lista a seu cargo até 25 de abril – 740$000. –
Importância do produto liquido da festa dada em benefício do Hospital, pelo
Prof. Oscar Rodarte recebida do Dr. Albergaria em 28 de Abril de – 211$700. –
Importância do benefício oferecido pelo circo de touros, e recebida do Dr. João
Borges em 9 de Abril – 162$500rs. – Importância recebida pela Exma. Sra. D.
Olímpia Caixeta de Mello, na lista a seu cargo – 30.000rs. Total 1:144.200rs.”
E parece que o apelo instigante feito
pelo jornal “O Riso”, surtiu algum efeito, nem tanto pela qualidade, mas pela
quantidade, de doadores, e no dia 16 de Novembro de 1915, publicaram uma lista
de contribuições para o Hospital S. Antônio, e pasmem, os doadores são de Carmo
do Paranaíba: “Hospital S. Antônio –
Vieram em nosso auxílio, para a construção de nossa Casa de Caridade, mais
alguns caridosos Srs. Moradores em Carmo do Paranaíba – Aristheu Caetano, 10$;
João Caetano, 10$; Horácio Araújo, 10$; Francisco Carlos da Silva, 10$; Dr.
Ferreira de Mello, 10. – Na antiga lista de D. Lina Borges, assinaram e pagaram
os seguintes Srs.: - Paulo Gomes, 5$; Bernardino C. da Costa, 5$; Augusto
Borges, 5$; Vicente P. de Andrade, 5$.”
Apesar de escrever este
artigo com apenas amostragens documentais e séries totalmente incompletas, é de
se supor que esse tipo de contribuição dos carmenses e de patenses, tenha
ocorrido em todo o período em questão,
como podemos ver impresso no mesmo Jornal “O Grito”, do dia 31 de Abril de
1916: “Hospital S. Antônio – Para a construção
da nossa Casa de Caridade, que brevemente virá preencher uma sensível lacuna em nosso meio, concorreram os
seguintes senhores, moradores em Carmo
do Paranaíba: Pe. Gregório
Lombraña, 20$;
Francisco Cherubim Vargas, 10$; Jovino da Costa Sampaio, 10$; Azarias José da
Silva, 10$; Braz Domingues de Araújo, 10$; Ananias Antônio de Menezes, 10$; Dr.
Leôncio F. de Melo, 10$.”
Um ano e três meses depois
do lançamento da campanha para a fundação do Hospital de Misericórdia, uma
extensa matéria anônima de primeira página aparece no Jornal, “Cidade de
Patos”, do dia 21 de Maio de 1916: “Para quando ficará o Hospital de
misericórdia? Será para as Kalendas gregas, ou para os idos de Maio dos
Romanos? – Há mais ou menos um ano, um grupo e moços, cheios de aspirações, com
a alma repleta de sentimentos santos, lançou em Patos a ideia da fundação de um
Hospital de Caridade. Esta ideia correu célere por toda a cidade; fizeram-se
reuniões, a eloquência abriu as suas comportas, os oradores falaram sobre a
caridade, os Padres trovejaram nos púlpitos acerca da caridade, as damas
correram pressurosas a angariar donativos, mas como tudo passa neste mundo,
passou também o espasmo caritativo do
povo de Patos.(...) A eloquência dos Padres, evolou-se nas abobadas do santuário (...) e por último as próprias
damas despiram seus ricos vestidos domingueiros, feitos expressamente para
festas de caridade e a fundação do Hospital, junto com sua irmã de leite a cruz
Vermelha das Damas, passou para o rol das cousas esquecidas. (...) A miséria
porém, fede e fede muito, as chagas aí são deletérias, senhoras que estão
habituadas a respirar perfumes, não podem permanecer por muito tempo no antro
da desgraça. Aí só descem habitualmente pela calada da noite, o padre e o
médico pela estrada de espinhos de seus silenciosos sacerdócios. E a caridade
vai-se como veio, o homem entrincheira-se de novamente atrás do seu egoísmo e de seu indiferentismo; e a
humanidade caminha enquanto a mesquinha fortuna vai retendo escassamente no
centro da penúria, os gafados pela doença e pelo contágio, perambulando pelas
ruas na triste profissão de pedintes. Como seria belo, ao lado dos grandes
edifícios destinados à instrução e à municipalidade, termos um destinado à
caridade! – Ao lado do Fórum que é o santuário das leis, termos o Hospital que é o dos grandes
devotamentos, onde os pulsos recomeçam a bater, onde as frontes recomeçam a
pensar. (...) Se nos edifícios públicos tremula ´o auriverde pendão de minha
terra que a brisa do Brasil beija e balança`, porque não desejar que tremule
nas ameias de um estabelecimento de caridade em nossa terra o pendão da
misericórdia? Na escala da perfectibilidade do sentimento na passagem do
egoísmo para o altruísmo, a caridade que se exerce em proveito de uma só [é]
insuficiente para remediar a situação aflitiva de milhares, é um sentimento bem
primitivo comparativamente a este outro que existe encarnado nas almas
benfazejas que fundam os hospitais, lugares onde se dá tréguas a desesperação,
onde os combalidos se revigoram, onde os enfraquecidos se temperam.” Palavras,
pungentes e eloquentes, que conjecturo, tenham sido escritas pelo baiano, Dr.
Eufrásio José Rodrigues, ainda mais depois da citação do poema de Castro Alves,
“o auriverde pendão de minha terra que a
brisa do Brasil beija e balança”...
Apesar dessas palavras um
tanto poéticas, mas prenhes de descrenças, e de acordo com o livro, “Uma
História de exercício da Democracia” (2006, p. 2004), “O vereador Eufrásio José Rodrigues apresenta
projeto, na sessão de 18 de setembro [1916], autorizando o Agente do Executivo
a auxiliar a construção da Casa de Caridade nesta cidade, com a quantia de
5:000$000, que deve ser entregue, de uma só vez, à comissão Construtora.” E em tempo, este
laborioso e dinâmico médico, além de ter sido médico, cronista e rábula, foi também vereador na
Câmara Municipal de Patos de Minas, em quatro legislaturas, de 1916 a 1926.
Teriam os patenses
desistidos de sua Casa de Misericórdia? Não creio, não todos, e não podemos nos
esquecer, que o mundo está em guerra desde 1914
e assim permanecerá até 1918. E,
além disso, com o fim da Primeira Guerra Mundial e talvez por causa dela, uma
outra iria continuar, sem sangue, mas com uma mortandade talvez cinco vezes
maior e que já foi estimada em cerca de 100 milhões de mortos, a guerra contra
a Gripe Espanhola. E nem Patos de Minas e nem lugar nenhum ficaria livre desse
mal e desse medo que assolou o Mundo, como sói acontecer com as pandemias, como
essa que estamos vivenciando hoje, essa terrível COVID-19, que provavelmente,
como a Gripe Espanhola, servirá como marco, para repensar novamente a questão
da saúde pública brasileira, para estes momentos inesperados. Pois como nos
alertou Dr. Eufrásio em 1908: “Que será de uma população como a de Patos se não
tiver um hospital, quando a varíola, o cólera ou a febre amarela vier
visita-la?- Morrerão todos porque foram
imprevidentes, ou porque tiveram dó de gastar um pouquinho de dinheiro em
favor daqueles a quem a mesquinha fortuna vai retendo escassamente no centro da
penúria.”
[grifo meu]
No entanto, outra prova
cabal de que a intenção de construir a Santa Casa ainda andava, ou se arrastava
é que em 1917, foi elaborado um projeto da fachada da futura Santa Casa da
Misericórdia, em cujo frontão do majestoso edifício seria estampado: Sancta Domus Misericordiae ( Santa Casa da Misericórdia).
Giovanni
Roncalli Caixeta Ribeiro, no Informativo Laudo, da Associação Médica, n. 9, de
Dezembro/2014, nos diz que: “No último
mês, chegou ao Centro de Memória ‘Dr. Adélio Maciel’ uma planta (fachada) da
Santa Casa de Misericórdia de Patos de Minas. A descoberta se deve ao arquiteto
Rogério Pina, irmão de nossa colega Maria Cecília Piau, aos quais agradecemos
por gentilmente cederem uma cópia para o nosso acervo. Quem admira o desenho,
exposto no nosso museu, fica impressionado com a beleza e a pujança da obra
imaginada pelo arquiteto Octaviano Lapertosa, de Belo Horizonte, que assinou a
autoria do projeto em novembro de 1917.” Otaviano Lapertosa (1889-1944),
que assinou o projeto em Belo Horizonte em Novembro de 1917, foi um arquiteto
italiano que trabalhou na nova Capital de Minas e foi um de seus construtores a partir de 1910. (SOARES, 1997, P. 136-7).
Biagio Polizzi (1871-1944), outro italiano que também assina o projeto, seria o
construtor da obra. (Idem, p. 209) Uma
pena este projeto não vingar, pois seria um dos mais belos edifícios de Santas
Casas de todos que já vi.
Um
outro fato curioso, é que esse arquiteto e também industrial, Otaviano
Lapertosa, requereu junto à “Câmara
Municipal de Patos”, na sessão de 19 de fevereiro de 1936, concessões e
incentivos para “organizar uma sociedade para montagem de moinhos, cultivação e
exploração da lavoura de trigo neste município”. (OLIVEIRA MELLO, 2006, P.
236). As concessões foram feitas neste
mesmo ano e a Cia. Moinhos Minas Gerais S/A., funcionou perfeitamente, mas em
1944, Lapertosa faleceu e a empresa tomou
outros rumos. (DANNEMANN, 2016)
Entretanto, e voltando ao
nosso Hospital, uma questão continua uma questão: quando se iniciaram as obras
da Santa Casa que seria o futuro Hospital Regional? Acredito que só um estudo
mais acurado e específico em outros jornais e documentos, Cartórios, Atas da
Câmara Municipal etc., a partir de 1916 poderão esclarecer melhor. E outras:
quando paralisaram? Quando recomeçaram? Por exemplo, sabemos que o terreno para
a construção do Hospital foi doado. Quando? Essa doação foi registrada em
Cartório? A Comissão Construtora,
obviamente possuía registros de receitas despesas, onde se encontra isso? A
Câmara Municipal desse período interferiu até que pondo, além das verbas? Infelizmente com essa pandemia, não nos foi
permitido pesquisas fora de minha biblioteca e minha quarentena.
O que eu tenho aqui e já
foi citado, é que em 18 de Setembro de 1916, Dr. Eufrásio, apresenta projeto, autorizando o Agente do Executivo
a auxiliar a construção da Casa de Caridade nesta cidade, com a quantia de
5:000$000, que deve ser entregue, de uma só vez, à comissão Construtora.” Foi repassado?
Geraldo Fonseca (1927-1995) também
menciona que, com a demolição da Igreja do Rosário, “...como era de grande importância o término da construção da Santa Casa
de Misericórdia, o material foi desviado para aquela obra.” (1974, p. 97)
Risoleta Maciel Brandão (1910-2009), em
sua emocionante comunicação sobre o “Cinquentenário do Hospital...”, de 1980,
revela que depois das doações dos lotes, “Empregou-se,
nesta arrancada, todo o dinheiro em Caixa e os materiais – pedras e madeirame –
da Igrejinha do Rosário, demolida em 1919.” Mas na verdade a Igreja do
Rosário foi demolida em 1920. E também,
nos diz que, as obras paralisaram, restando apenas, “em sossego os alicerces (...) e logo sumido no capinzal”, mas não
diz quando, e que, “Em 1924 o caso voltou
à tona (... ) Em pouco, reiniciava-se a construção. A ´Santa Casa de
Misericórdia`, conforme chamam-na, expandiu-se em acréscimos, alarga-se em
amplas dimensões, contando com gordas verbas estaduais obtidas por Olegário
Maciel, na ocasião, vice-presidente do Estado, em exercício.” Entretanto,
“Dado ao esgotamento das ditas verbas,
foram suspensos os trabalhos. Não obstante
Olegário na presidência do Senado Mineiro (1926-1930) e Adélio Maciel
(...) na Assembleia Legislativa, em Belo Horizonte, uma corrente contrária agiu
(...). E toda aquela barafunda de fios elétricos, ladrilhos, azulejos,
banheiras etc... – já aqui de antemão armazenada, - tomou o rumo de onde viera,
sendo desviada para o Hospital de Barbacena. Corria 1927. Mas acontece que, em
torno da esfera política gravitam mundos e surpresas, e, em 1929, (...)
Voltaram à carga com o projeto, desta vez, numa investida animadora.(...)
aproveitando a base já curtida de tanto esperar. Da Capital brotaram
engenheiro, construtor, técnico, mestre-de-obras, pedreiros e toneladas de
materiais. O certo é que no final do quatriênio do govêrno Antônio Carlos,
(1926-1930), pudemos contemplar o sonho convertido numa realidade.”
Seria interessante, em outra ocasião, um
cotejo, do pronunciamento de Risoleta Maciel Brandão, com o “Levantamento das
Leis e Decretos Estaduais Referentes a Patos de Minas no período de
1893-1930.”, feito por Galba Ribeiro Di Mandro em 1971. Dentre as leis e
decretos estaduais que levantou, duas
leis e cinco decretos, de 1920 a 1930, tratam de verbas destinadas ao agora
Hospital Regional. Antes, porém, quero corroborar o que Risoleta Maciel Brandão
escreveu sobre a presença de Olegário e Adélio Maciel nas esferas do Governo
Estadual na década 1920. Realmente, Olegário Dias Maciel (1855-1933), foi
quatro vezes governador, ou presidente, como diziam naquela época, do Estado de
Minas Gerais, como vice-presidente em exercício, três vezes em 1924 e uma vez em
1926, e de fato eleito, de 1930 a 1933. Foi também Deputado Provincial,
Estadual e Senador Estadual. Adélio Dia Maciel, Deputado Estadual de 1919 a
1930 e de 1934 a 1937, e Agente Executivo ou Presidente da Câmara, o
equivalente hoje a Prefeito, de 1918 a 1926, e claro, médico.
Abaixo intercalarei as leis e os
decretos na sequência temporal, para se ter uma ideia das verbas ou possíveis
verbas para o Hospital de 1920 a 1930.
A primeira Lei de Nº 798 de 25/09/1920, “Orça a receita e fixa a despesa para o exercício
de 1921 nº 33: auxílio ao Hospital Regional de Patos no valor de 2:000$000.”
Note-se, que aqui o Hospital, não é mais Santa Casa da Misericórdia, nem Casa
de Caridade, nem Hospital Santo Antônio, mas sim Hospital Regional de Patos de
Minas.
“Decreto de
Nº 7321 – 24/08/1926 – Abre crédito especial de 150:000$000 para a conclusão da construção e instalação do Hospital ´Olegário Maciel`, na cidade de Patos”. Aqui, o
Hospital, já muda de nome e aparece como Hospital “Olegário Maciel”.
“Decreto
de Nº 7938 – 27/09/1927 – Abre créditos
especiais para ocorrer [sic] a despesas a cargo de secretaria da Segurança e Assistência Pública. 91:910$000 para pagamento de despesas
realizadas com a compra de materiais para construção do Hospital ´Olegário Maciel´, da cidade de Patos, em
1926.”
“Lei
de Nº 1016 – 03/08/1928 – Dispõe sobre a abertura de créditos especiais
(200:000$000 para pagamento da conclusão das obras de construção do Hospital
Regional ´Olegário Maciel´ na cidade de Patos).”
“Decreto
de Nº 8738 – 30/08/1928 – Abre um crédito especial de 200:000$000 para ocorrer às despesas com a
conclusão das obras do Hospital Regional
de Patos.”
“Decreto
de Nº 9641 – 25/08/1930 – Dá a Denominação de ´Coronel Antônio Dias Maciel´
ao Hospital Regional de Patos.” Aqui, depois da inauguração, o
nome definitivo ou quase.
“Decreto de Nº 9665 – 02/09/1930 – Abre um
crédito especial de 259:626$540 para
ocorrer a despesas com a instalação de
custeio do Hospital Regional de Patos.”
E, também alguns fatos curiosos que
aconteceram nesta trajetória, curiosos e lamentáveis, mas infelizmente
corriqueiro em nosso País, mesmo em se tratando da construção de um Hospital ou
de uma Santa Casa da Misericórdia, aliás, que também aconteceram em muitas
delas de cá e de lá do Atlântico.
Estes fatos foram transcritos de jornais
de 1925 e 1927 e relatados por Altamir Fernandes de Sousa, no Jornal “Folha Patense”, de 29 de maio de
1999.
O primeiro fato foi: “A primeira paralisação das obras aconteceu
no longínquo ano de 1925, quando o Presidente (Governador) de Estado, Mello
Vianna proferiu as seguintes palavras: ´quero que os dinheiros públicos sejam
aplicados visando o interesse da collectividade e escrupulosamente gastos´;
´não basta construir, é preciso bem fiscalizar e conservar o que o Estado
constroe, evitando, assim, que tão elevados dispêndios dos cofres públicos
sejam mal aplicados, em obras imperfeitamente executadas.` O Jornal de Patos,
em sua edição nº 32, de 03 de maio de 1925, afirmava que a ´suspensão das obras
foi tomada por não estarem os empreiteiros cumprindo, escrupulosamente o
contracto´.”
O segundo fato foi: “HOSPITAL REGIONAL DE PATOS -
Pela segunda vez foram suspensas as obras da construção do Hospital Regional de
Patos, custeadas pelo Estado. Da primeira vez, o motivo de medida tão extrema
foi o governo verificar que o material, a mão de obra e tudo mais não obedeciam
as exigências contractuaes. - Foi o que se soube. O facto é, que o serviço, foi
suspenso e, depois de reiniciado, por administração directa do Estado,
remodelado o que já estava feito e prosseguido sob uma orientação diferente da
primitiva e obediente às exigências administrativas. - Agora, novamente, nova
suspensão. - Por que? - Dizem alguns que não há verba pra sua conclusão, e, já
estando esgotada a que era destinada para tal fim, o governo resolveu paralisar
o serviço, até segunda ordem; outros, porém, os que sabem tudo, ou antes tudo
lêem no ar, enchem a cidade de novidades e affirmam que há nos serviços do
hospital irregularidades bastante lamentáveis. - Propositalmente ainda não
procuramos ouvir o engenheiro desta circunscrição a respeito das causas
motivantes de semelhantes medida; contentamo-nos em registrar o facto, para
conhecimento do público, e nada mais. - É por este e outros motivos que lá
fora, em Belo Horizonte, quando os homens do governo ser referem aos serviços
públicos em Patos, dizem significativamente – AQUILO ALLI, É UM PROBLEMA.”
(Transcrito por Altamir Fernandes, na íntegra, inclusive a grafia do Jornal de Patos, nº 116, de 23 de
janeiro de 1927).”
E
o terceiro fato foi: “HOSPITAL REGIONAL DE PATOS – PERFÍDIA E
INFÂMIA - O Hospital Regional de Patos, construção de vulto que, há dois annos,
está sendo feita nesta cidade, a expensas do Estado, é o attestado
indestructível, levantado em pedra e cal, do pouco escrúpulo dos que têm estado
à frente de sua administração, tanto assim que, já por duas vezes, devido às
irregularidades nas obras, impropriedade do material empregado e, mais ainda,
devo ao desvio clandestino da matéria prima alli accumulada e destrahida para
construcções particulares, teve o engenheiro, Dr. Lauro Rodrigues Valle, de
suspender os serviços, sob o fundamento de que o Estado vae sendo lesado, em
polpudas importancias, já subindo a centenas de contos o que foi gasto, fora do
primitivo orçamento, e extra-muros do monumental edificio. - Por esses motivos
que, em qualquer parte do mundo, onde a moral ainda é uma força, o caracter,
uma verdade, a consciência uma sentinella e a honestidade um patrimônio sagrado
dos administradores públicos, por esses motivos, justamente, o Dr. Lauro Valle
despertou aqui, entre os que parece, desejam que a sobras sejam continuadas sem
fiscalização e sujeitas a todos os inconvenientes apontados pelo illustre
profissional, uma animosidade tal que, para seu afastamento desta Cidade, não
trepidam em descer à perfídia e infâmia mais soez, à intriga baixa e
tendenciosa, à ameaça e pressão, physica e moral. O Dr. Lauro Valle, em seu
relatório, diz textualmente que: ´examinando as obras do Hospital de Patos,
verificou que não havia honestidade em sua construcção; que o material, estava
sendo desviado para construcções particulares, nesta cidade; e que outros
materiais ainda tinham sido dalli retirados pelos próprios fornecedores...´” (transcrito por Altamir Fernandes, na
íntegra, inclusive a grafia da época, do
Jornal de patos, nº 151, de 23 de outubro de 1927).”
De qualquer forma, no dia 18 de julho de
1930, o Hospital Regional seria inaugurado, depois de uma década e meia, ou
seja, depois daquele magnificente 21 de
fevereiro de 1915, quando a comunidade, homens e mulheres, jovens e idosos,
enfim, patenses se reuniram no Cinema Magalhães não faziam a mínima ideia de
suas jornadas. E quem sabe quando se tem um ideal? E isso importa?
O que importa é que depois de quase ser
uma Santa Casa da Misericórdia, Casa de Caridade, Hospital “Santo Antônio”,
Hospital Regional de Patos, Hospital “Olegário Maciel”, acabou plantando suas
raízes, sólidas raízes, com um sobranceiro e forte tronco de 90 anos, marcado
pela intempérie cruel e às vezes benéfica, cujo frondoso folhedo continua com a
sua quase secular missão de salvar vidas e minorar as dores de todos os
patenses, como Hospital Regional “Antonio Dias”.
Hospital Regional – Década de 30 - Foto Geraldo Fonseca 1974
Hospital Regional 2020 -
Foto José Eduardo de Oliveira
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Grito, 22.03.1915
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